terça-feira, 7 de janeiro de 2020

A divina fogaça de José de Anchieta
“Da mesa da páscoa para o altar da Eucaristia”



Pe. Felipe de Assunção Soriano, SJ *

José de Anchieta de fato foi um grande poeta que colocou toda a sua arte a serviço da fé. De suas mãos temos acesso a um poema em língua portuguesa, único e avulso nesta língua, que foi traduzido posteriormente para o latim, composto por 188 versos e sobre a Santíssima Eucaristia. Foi extraído do Manuscrito de Algorta e publicado no 5º volume de suas Obras Completas por Armando Cardoso, SJ . Por causa do seu lirismo e conceituação, a poesia pode rivalizar com os hinos de S. Tomás de Aquino e de João Peckam como verdadeiro hino eucarístico. Sua preocupação com a catequese é elemento marcante em suas poesias, pois, quando precisa alcançar os homens com sua lírica, faz uso de tudo que tem a mão. Diante de matéria tão fina como a Eucaristia, José de Anchieta não se furtará a missão de apresentar a sua devoção aos homens do seu tempo. Como é próprio de sua catequese, recorrendo a sua memória afetiva e as tradições portuguesas e indígenas, irá comparar a Eucaristia a um pão doce, feito em casa, muito popular na Europa e aqui no Brasil. Nesta alusão direta, que passa despercebido aos olhos, nos dá pretexto para falar de sua abertura e inculturação. Vejamos o poema:
Ó que pão, ó que comida,
ó que divino manjar
se nos dá no santo altar,
cada dia!
Filho da Virgem Maria,
que Deus Padre cá mandou
e por nós na cruz passou
crua morte,
e para que nos conforte
se deixou no sacramento,
para dar-nos, com aumento,
sua graça.
Esta divina fogaça
é manjar de lutadores,
galardão de vencedores
esforçados,
Deleite de namorados,
que co’o gosto deste pão,
deixam a deleitação
transitória.**

O popular pão doce se chama fogaça, mais conhecido como fogaça de Santa Maria da Feira, gastronomia portuguesa da região de Aveiro e Porto . Tem sua origem a partir de um voto feito a S. Sebastião, contra a peste, em 1505. A promessa consistia em realizar uma festa anual, a 20 de janeiro, em honra de S. Sebastião se se livrasse os feirenses de tamanho mal. O voto da promessa foi fazer a fogaça, bolo cujo formato remonta as quatro torres do castelo de Feira. Por causa deste “voto” registram-se grandes jogos promovidos por festejos de Igreja – as Fogaceiras, cujo prêmio para os vencedores era a fogaça. Em outras regiões de Portugal, como é costume nas famílias, encontramos a fogaça à mesa no tempo pascal.
Outra tradição mais antiga, de mais de 600 anos, faz memória a um naufrágio que não aconteceu por intervenção da Virgem Maria em Alcochete. Um pescador, vendo-se aflito, pediu a ajuda da Virgem Santíssima que lhe apareceu no monte de Atalaia. Chegando a salvo a Alcochete prometeram ir agradecer à Virgem em Atalaia deixando lá uma réplica do seu barco e uma bandeira. Para comemorar este fato, inventaram o este bolo fogaça com forma redonda. Todos os anos, no tempo da Páscoa, se realiza um Círio Marítimo para agradecer a intercessão da Virgem que os salva em momento de aflição . Como um dos tantos pães típicos do tempo da Páscoa, em outras regiões de Portugal, é comum encontrar as madrinhas presenteando seus afilhados com uma fogaça. A tradição manda que a fogaça seja servida partida à mão e dada aos começais, fazendo clara alusão ao pão partido em nome do Senhor. Por isso, fazendo memória da vitória de Cristo sobre a morte, é José de Anchieta quem nos convida a redescobrir este sinal que, em sua catequese inculturada, remete-nos a Cristo na Eucaristia.

* Padre Felipe é jesuíta e mestrando em teologia pelo programa de Pós-Graduação da Universidade Católica de Pernambuco - UNICAP. Orientadora Prof. Dr.å. Alzirinha Rocha de Souza. (felipeassj@yahoo.com.br).
** ANCHIETA, José de. Lírica portuguesa e tupi (Obras Completas, 5º Volume). São Paulo: Loyola, 1984, p. 102-106.
RECEITA:
Ingredientes para o fermento
. 200 g de farinha
. 120 ml (ou mais) de água morna
. 50 g de fermento fresco de padeiro
Ingredientes para a massa
. 600 g de farinha
. 160 g de açúcar
. 120 g de manteiga sem sal
. 3 ovos
. 1 colher (café de sal
. 1 colher (café) de canela em pó
. raspa de limão.
PREPARAÇÃO:
1 - Dissolva o fermento na água tépida e deixe repousar um quarto de hora. Depois adicione a farinha e mexa até obter uma massa relativamente mole. Deixe levedar cerca de meia hora (depende da temperatura ambiente) para que aumente de volume.
2 - Depois, adiciona-se o açúcar com a canela, o sal, os ovos, a raspa de limão, a manteiga e a farinha necessária para se obter uma massa um pouco mais consistente do que a do pão. Deixa-se fermentar o tempo necessário para a massa dobrar de volume.
3 - Seguidamente, pega-se na massa, divide-se ao meio e molda-se cada uma das partes num rolo comprido semelhante a uma serpente, isto é, mais espesso num dos lados. Espalma-se este rolo com a mão, ficando uma tira que se começa a enrolar pelo lado mais largo, resultando numa pirâmide.
4 - À medida que se vão enrolando, vão-se colocando as pirâmides num tabuleiro forrado com um pano polvilhado com farinha onde voltam a crescer (entre 30 minutos e 1 hora). Pincelam-se com ovo batido e, com uma tesoura, dão-se 4 golpes no topo da pirâmide de que resultarão as "torres do castelo".
5 - Introduzem-se as fogaças no forno quente a (200º) e, a meio do cozimento (cerca de 15 minutos depois), tiram-se para fora e separam-se as "torres do castelo", permitindo assim que o calor penetre no interior das fogaças, cozendo-as uniformemente. Voltam ao forno para acabar de cozer. As fogaças devem ficar loirinhas e não queimadas, e cozidas mas não em demasia. Verificar a cozimento introduzindo uma faca no meio; se esta vier seca, o bolo está pronto (http://www.dulcerodrigues.info/ga…/…/receitas_fogaca_pt.html).

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